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A mostrar mensagens de abril, 2012

A crise num centro comercial perto de nós

Os portugueses falam sobre o corte do subsídio de Natal nas mesas dos cafés e encolhem os ombros. Vêem na televisão as notícias sobre o galope do desemprego e sorriem com indulgência. Ouvem na rádio que os impostos vão aumentar e perguntam por novidades. Lêem no jornal que não vão abrir novos centros comerciais em 2012 e gritam espavoridos: “Meu Deus, a crise chegou!” Na condição de apreciador confesso de grandes superfícies de consumo, trata-se de uma notícia que me deixa triste. É em momentos como este que tomo pulso à verdadeira dimensão da carestia que nos está a afectar. Olho para o mapa de Portugal e pergunto-me, com os olhos emudecidos, o que será das boas gentes da Beira Baixa sem um Dolce Vita Alcongosta; qual o futuro da juventude alentejana sem um Canal Caveira Shopping; que sorte estará reservada aos transmontanos sem um Fórum Alfândega da Fé. Para muitos portugueses, os fins-de-semana vão deixar de fazer sentido. Os lisboetas, por exemplo, terão de se contentar em

O Praça Velha morreu! Viva o Praça Nova!

O Tribunal da Relação de Lisboa deliberou que a Adega Cooperativa do Fundão não pode continuar a comercializar o vinho Praça Velha. Em causa está a alegada semelhança com o nome Barca Velha, da Casa Ferreirinha. “ Lendo-as e relendo-as, ouvindo-as e voltando a ouvi-las, lenta e rapidamente, o som das duas palavras, a memória visual e a imagem que nos fica é a de que não existe entre as marcas individualidade”, explicou o juiz. Depois acrescentou "esta pinga é mesmo boa" enquanto apalpava as pernas da escrivã e trauteava a canção Vinho do Porto de Carlos Paião e Cândida Branca Flor. Infelizmente, nenhum dos jornalistas presentes deu conta destes últimos factos. Refira-se, em abono da verdade, que a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa terminou com um problema que andava a depauperar as finanças de muitas famílias portuguesas. Está devidamente comprovado pela DECO que vários casais ficaram sem dinheiro para a prestação da casa após terem passado por uma garrafeira.

Bem-vindos ao Festival dos Tubérculos e Verduras

Na Cova da Beira há actualmente o Festival da Cereja, em Alcongosta, o Festival da Castanha, em Belmonte, ambos criados em 2007, o Festival da Cherovia, que principiou em 2008, na Covilhã, e o Festival do Cogumelo, organizado desde 2009 no Alcaide. Trata-se, como já devem ter percebido, de um forte surto festivaleiro que está a atacar a região. Por esse motivo, o Rancho Folclórico “Romeiros de Santa Luzia” tomou a atitude destemida e refrescante que há muito se justificava – realizou o Festival do Grelo no Castelejo. Face ao sarcasmo do parágrafo anterior, devo fazer a seguinte ressalva para evitar mal-entendidos: sou um grande fã de certames que têm como cabeças de cartaz tubérculos, legumes e todo o género de fungos. Aproveito até para confessar que espero com ansiedade pelo dia em que um autarca mais arguto organize o “Mega Festival das Hortaliças, Frutas e Derivados in Zêzere”. No palco principal poderiam actuar a cereja, a cherovia e os míscaros. Já os palcos secundários ficariam

Pela anglicização da língua portuguesa

Conheço várias pessoas que se queixam do alegado excesso de termos em inglês utilizados na língua portuguesa. Dizem-no como se se tratasse de uma realidade que estivesse aí, visível, audível, examinada, take for granted. Com toda a fairness, teoria mais rebuscada não pode haver. Estou em crer que terá nascido do underground mais profundo das suas mentes conspirativas. Não obstante, gostava que estivessem certos. Na verdade, quem dera à sinuosa língua de Camões ser polvilhada pela rectilínea língua de Shakespeare. Provavelmente passaríamos a ter outra desenvoltura e outra coolness na maneira de nos expressarmos. A nossa comunicação deixaria de se enredar nos enredados verbos irregulares, de escorregar na escorregadia conjugação dos particípios passados e de se atolar no excepcional atoleiro das excepções gramaticais. Passaríamos a falar num bom asfalto linguístico, liso, sem buracos, o que nos permitiria ir straight to the point sempre que quiséssemos abordar um assunto. Além disso, o

A arte trovadoresca dos falsos recibos verdes

A figura do falso recibo verde é uma óbvia recriação contemporânea dos trovadores medievais. Foi plasmada pelo patronato mais dado ao lirismo, esses grandes suseranos dos tempos modernos. A relação é tão evidente que não percebo como é que os estudiosos da literatura portuguesa ainda não deram por ela. Analisemos então os argumentos que sustentam a minha tese. O trovador do século XII cantava o seu amor superlativo, e tantas vezes inglório, à dama, que se mantinha distante e indiferente à coita daquele, nunca lhe dando um beijo que fosse. O falso recibo verde do século XXI submete-se a oito ou mais horas de trabalho, cumpre ordens, ouve responsos azedos, e tantas vezes injustos, e não consegue agradar ao patrão, que se mantém alheado do estado precário daquele, nunca lhe concedendo a esperança de um dia assinar contrato, por mais ténue que seja. Nas suas trovas, o segrel cantava um amor não correspondido. Era um vassalo dos humores da senhora, cuja frieza marmórea o privava da felici