O ordenado mínimo desceu? Venha então mais um elogio da Alemanha

Há alguns meses, a chanceler Angela Merkel afirmou ter um “grande respeito” pelas reformas estruturais que estão a ser implementadas em Portugal. Mais recentemente, o ministro das finanças alemão, Wolfgang Schäuble, sublinhou, não sem uma ponta de ciúme, que o seu homólogo português, Vítor Gaspar, era “o homem certo no lugar certo” para debelar a crise. Acto contínuo, Philip Rösler, ministro da economia, curiosamente também da Alemanha, frisou que o caminho “muito difícil” seguido por Portugal “está a ser traçado de forma exemplar para a Europa e para o mundo”. Perante estes três casos, a primeira ilação a tirar é que os alemães, afinal, não são desprovidos de sentido de humor.

Tamanha enxurrada de elogios só podia redundar em 81 milhões de invejosos em relação ao exemplo da Europa e do mundo. Na verdade, quando um trabalhador alemão ouve falar do desemprego em Portugal, é obrigado a pregar os olhos no chão, em silêncio. Não apenas por vergonha, mas também para ver se encontra a enfezada taxa de desemprego-bonsai de 6,5% que o seu país tristemente ostenta. Depois, olha para o céu e deixa escapar um suspiro desgostoso ao contemplar o imponente eucalipto português de desempregados que ondula do alto dos seus 15,3%.

O ordenado mínimo de 485€ é outro aspecto que acirra a inveja teutónica. Se ganhassem esse valor mensal, limitavam-se a comprar, pacificamente, cervejas e salsichas no Lidl mais perto de casa e a andar de bicicleta todos os dias. No entanto, como o salário mais baixo dos alemães ronda os patéticos 1100€, todas as semanas rebentam terríveis discussões conjugais sobre o próximo destino de férias e sobre o carro que devem comprar.

Quanto a reformas estruturais, basta admirar as quatro fundações extintas e a fusão, ou extinção, até ao momento, de zero das 4 259 freguesias e das 308 autarquias portuguesas. Não há dúvida que tamanho espírito reformista merece ser cantado por toda a parte.

É curioso verificar que a qualidade dos elogios da Alemanha a Portugal aumenta na razão oposta da qualidade da situação financeira de Portugal em relação à Alemanha. A continuar por este caminho, em breve os portugueses terão a auto-estima de um José Mourinho e a qualidade de vida de um ruandês. Depois do salazarento pobres, mas honrados, Angela Merkel parece querer transformar o povo lusitano em miserável, mas fanfarrão. Pode não parecer, mas é uma evolução assinalável 38 anos após o 25 de Abril.

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