Mais pieguice, sff

O primeiro-ministro exortou, há algumas semanas, os portugueses a deixarem de ser tão piegas. O seu pedido merece um comentário tão pertinaz quanto cuidadoso.

Ponto prévio: não é líquido que o destinatário do discurso fosse o povo português em geral. Quando se olha para a idade dos assessores dos ministros, ganha força a hipótese de que Pedro Passos Coelho estivesse a dar um responso apenas àqueles para que se façam homens. Provavelmente está cansado de aturar as birras e as queixas dos rapazinhos que, coitados, recebem um espartano salário de três mil euros brutos após anos e anos de árduo labor a agitar bandeiras laranjas em comícios e caravanas. E ainda há quem diga que a austeridade não toca a todos.

Seja como for, andou mal o primeiro-ministro ao dizer o que disse. Numa altura em que o país perdeu soberania financeira, em que o estado está a vender as empresas a estrangeiros, em que os nossos clubes de futebol podiam jogar na América do Sul, os portugueses sentem necessidade de se agarrar a algo que ainda lhes pertença. É por essa razão que não largam a pieguice nem por nada, elevando-a a símbolo nacional, lado a lado com a padeira de Aljubarrota e o galo de Barcelos. Penso que ninguém os pode censurar por isso, apesar de não haver qualquer razão, como o desemprego ou o aumento dos impostos, para que passem a vida a lamuriar-se.

Mais do que um orgulho nacional, no entanto, a pieguice pode ser a solução para a retoma da nossa economia. Basta substituir o indicador Produto Interno Bruto pela Pieguice Interna Bruta para que passemos a ser olhados com respeito pela senhora Merkel. Tenho a certeza que dentro em breve seremos o país da Zona Euro com maior distribuição de pieguice per capita. Já para não falar de que a nossa pieguice mínima irá fazer inveja a qualquer luxemburguês e que a produtividade de pieguice dos trabalhadores portugueses será um case study nas universidades alemãs.

No seu discurso, Pedro Passos Coelho ignorou também que o fado apenas ganhou dimensão mundial por ser uma canção piegas por natureza. Na verdade, creio que esse será o caminho para que o ministro Álvaro Santos Pereira consiga exportar os pastéis de Belém. Só uma comunicação que aposte forte na pieguice fará o mundo sujar os lábios de canela. “Pastéis de belém – de comer e lamuriar-se por mais”, poderá muito bem ser o primeiro slogan que levará a nossa especialidade a passar além de Badajoz.

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