Se tiver dívidas ao fisco, não conduza
Há
alguns séculos era comum os incautos viajantes serem abordados por salteadores
de estrada que lhes gritavam, enquanto brandiam um revólver: “A bolsa ou a
vida!”. Hoje em dia, os automobilistas correm o risco de ser interpelados por
funcionários do fisco que os ameaçam empunhando um portátil: “A regularização
das dívidas ou a penhora do carro!” Como é óbvio, há uma certa diferença entre
as duas situações. Apesar de tudo é muito melhor perder a vida do que cair nas
garras do fisco português. Além disso, na primeira situação a pessoa ainda tem
a esperança de que as autoridades apareçam à última hora e prendam os
meliantes; já no segundo caso, os Bonnie and Clyde lusitanos formam uma
quadrilha com a polícia.
Depois
dos radares e dos condutores que não saem da faixa do meio, não cometerei nenhuma
heresia se considerar o fisco no asfalto o terceiro cavaleiro do Apocalipse
Rodoviário anunciado nas Escrituras. Por essa razão, desde o início desta
semana só pego nas chaves do carro depois de confirmar que a minha situação
fiscal está em dia. Creio que seria importante que a Autoridade Nacional para a
Segurança Rodoviária lançasse campanhas de sensibilização sobre os perigos que
os condutores correm se conduzirem sob o efeito de dívidas ao fisco. “Se tiver
dívidas ao fisco não conduza”, “A Joana ficou sem carro por ter dívidas ao
fisco e nunca mais pôde ir buscar o filho ao colégio” ou “Mais vale perder 376
horas na loja do cidadão e no portal das finanças a regularizar as dívidas ao
fisco do que ficar sem carro num minuto” poderiam ser algumas das mensagens.
Entretanto,
o Ministro das Finanças já veio dizer que a iniciativa “Acção sobre rodas” não
é para continuar. É uma decisão que lamento, devido ao potencial que tinha em
dinamizar a economia. A pessoa que vê o seu carro penhorado, poderia seguir com
a sua vida se tivesse ali perto um stand de trotinetas. Também não enjeitaria a
aquisição de uma garrafa de água e talvez um calçado mais adequado, caso fosse
tomada por um súbito desejo de praticar jogging. Creio mesmo que esta ideia
deveria ser alargada a outros contextos. Porque não pôr os funcionários das
finanças à saída dos supermercados a penhorar as compras aos devedores? Ou
mesmo nas cerimónias de casamento? Quando o padre perguntasse se alguém se opõe
ao matrimónio, o funcionário das finanças levantar-se-ia e questionaria os
noivos se têm dívidas às finanças. Em caso afirmativo, avançaria com a penhora
do copo de água. Assim, evitar-se-ia que conduzissem não só sob o efeito de
dívidas ao fisco, mas também sob o efeito do álcool. É menos perigoso, mas às
vezes pode provocar um ou outro acidente.
Comentários
Enviar um comentário